sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Constatação

É um simples sinal da passagem do tempo, da renovação dos gostos e do nosso próprio envelhecimento: a peça da RTP que, há uns dias atrás, falava do cartaz da passagem de ano organizada pela CML no Terreiro do Paço, apenas referia, de passagem, a actuação de Rui Veloso; para o mesmo dia era dada ênfase especial a Agir (com direito a entrevista e tudo), artista que, muito provavelmente, dirá muito mais às pessoas que escolherem aquele local para a passagem de ano. A mim, que nem sou uma fã especial de Rui Veloso, custou-me. Mas pronto... É assim mesmo...

Presentes

Uns dias depois do Natal, no seu quarto, algumas das caixas onde vinham os brinquedos ainda estão espalhadas. Os papéis que os embrulharam também ainda estão a um canto. Os pais, os tios, os primos que os compraram naquela promoção de um hipermercado estão ainda a colocar no facebook as fotografias da emoção que se viveu quando o tio Manuel, vestido de Pai Natal, chegou pouco depois da meia-noite. Entre si, os gostos multiplicam-se e trocam-se emojis cheios de intenção. 
Esta manhã, aproveitando o sol, ele foi para a rua brincar. A única coisa que levou consigo foi uma vassoura. Montado nela era, certamente, um cavaleiro. 

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

E porque teria que ser diferente?

Mal o sinal fecha ela avança para os automóveis parados. O seu "bom dia" chama a atenção e é ouvido por todos os que passam, automobilistas e peões. Tem sempre um largo sorriso enquanto distribui o jornal gratuito. Esta semana, ao bom dia, tem acrescentado as Boas Festas. Olho sempre para ela a tentar descortinar se a boa disposição é genuína. Até agora sempre me pareceu que sim. 

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Duas coisas (entre outras)

que não compreendo em relação ao Metro de Lisboa: 
  • porque razão insistem em anunciar, pelo sistema de som, de x em x segundos, que as linhas amarela, verde, azul ou vermelha; ou duas delas; ou três delas (quatro ainda não ouvi) se encontram com perturbações? Há muitos meses que temos que ouvir isso em non stop. Esqueçam: nós já percebemos. Não vale a pena querer fazer parecer esporádico o que já é um facto permanente;
  • dada toda a situação  que só parece ter tendência a agravar porque é que, de uma forma que soa a ironia pouco elaborada, nos andam a desejar um novo ano cheio de boas viagens? 

Não é bem isso mas...

Nas duas vezes em que estive grávida a minha colega Sofia bem que dizia para eu ter atenção porque os neurónios tinham tendência a fugir do cérebro para a barriga... Estas brincadeiras...

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Que gente esta...

O estado de saúde de Mário Soares tem sido hoje motivo de notícias na comunicação social. Os problemas que tem tido e a sua avançada idade não auguram nada de bom. Como todos os políticos, sobretudo os que se destacaram na vida dos seus países, terá muitos apoiantes e opositores. O seu pensamento e acções podem e devem ser discutidas, claro. Mas não consigo deixar de ficar perplexa ao ver, também neste caso, como noutros, a quantidade de afirmações absolutamente ignorantes, boçais e destituídas de bom senso deixadas em algumas caixas de comentários. 
Felizmente todos somos livres de manifestarmos as nossas opiniões. Mas fico triste ao perceber que, mesmo perante uma situação destas, há quem não se coíba, de uma forma absolutamente primária, de papaguear ideias sem que se vislumbre um mínimo de reflexão. Mas é a falta de humanidade e de solidariedade que mais me choca. E estas nem o bom exemplo do actual Presidente da República consegue ultrapassar...

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Uma esperança

Até hoje nunca tinha ouvido falar de Artur Anselmo. Espero, no entanto, que a sua voz tenha algum peso na reversão da trapalhada linguística em que estamos mergulhados. O facto de alguém na sua posição questionar o tal acordo do nosso descontentamento já é um passo importante. Que seja o princípio do fim é o que desejo. 

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Inesquecível

A versão de Jorge Palma de Avec le temps de Léo Ferré, cantada esta noite no CCB.

domingo, 27 de novembro de 2016

You are beautiful

Quando Brel morreu eu nem sabia sequer da sua existência. Por isso não tinha qualquer noção de como as canções que escreveu iriam fazer parte da minha vida. A sua morte só me doeu mais tarde quando o conheci através dessas canções.
A Cohen conheci-o mais ou menos na mesma altura. A nossa adolescência é um período que deixa marcas e a música que ouvimos nessa fase acompanha-nos sempre. As suas canções primeiro, os seus poemas depois, cá continuam, comigo. A eles regresso como sempre se regressa aos clássicos. Cohen foi um poeta maravilhoso e soube acrescentar valor aos seus poemas com a música que, no seu caso, o elevava e nos eleva. Agora que morreu estranha-se esta dor de saber que não teremos novas canções. Consola-nos o facto de, tal como Bowie, Leonard Cohen se ter despedido de nós com a sua arte, deixando-nos a sensação de sermos uns privilegiados. Se uns dias antes da sua morte deixei aqui um poema em canção, deixo agora, como já tinha feito há uns anos, um poema sem canção.

My time

My time is running out
and still
I have not sung
the true song
the great song

I admit
that I seem
to have lost my courage

a glance at the mirror
a glimpse into my heart
makes me want
to shut up forever

so why do you lean me here
Lord of my life
lean me at this table
in the middle of the night
wondering
how to be beautiful

in Leonard Cohen, Livro do Desejo, Vila Nova de Famalicão, Edições Quasi, 2008, p. 178

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Lágrimas

Não é fácil confortar uma filha que, aos 16 anos de idade, acorda e percebe qual foi o resultado das eleições presidenciais nos EUA. Neste mundo que nos faz estar tão perto de um país do outro lado do oceano, ela tinha, desde o início do processo eleitoral, sentido uma grande simpatia por Bernie Sanders e não percebia como não tinha sido ele o escolhido para se candidatar pelo partido democrata. Mas disto é que ela não estava mesmo à espera. As suas lágrimas são semelhantes às de muitos que, no mundo inteiro, dificilmente acreditam que Trump será mesmo presidente. Mas a verdade é que foi isso mesmo que ficou hoje decidido. 
As surpresas em eleições são cada vez maiores e se as sondagens deixam de conseguir fazer previsões acertadas devem-no muito à aceleração que se vive, incluindo a da mudança de opinião, o que faz com que, factores ou casos singulares, muitos deles manipulados por instituições e órgãos de comunicação social, façam a diferença de um dia para o outro. No caso destas eleições não foi só isso que aconteceu. Ao longo do dia muitos jornalistas e figuras públicas, a começar pelos que mais apoiavam Hillary Clinton, fizeram um mea culpa por não terem conseguido passar a mensagem e por terem subestimado Trump, assumindo que a vitória democrata seria incontestável. Mas afinal foi Trump quem viu a sua estratégia de non sense político levar a melhor. Foi ele que percebeu que os jornalistas, os actores, os cantores, os artistas e intelectuais no geral, são só uma pequena parte dos eleitores. E, na verdade, fazendo uma analogia com a televisão, por muito que se apresentem programas com elevado interesse e que muitos se pronunciem sobre o seu valor, as audiências serão sempre mais favoráveis aos programas inconsequentes e absolutamente desprovidos de aspectos positivos que apelam ao mais primário dos telespectadores. Pode parecer uma visão elitista mas os resultados das eleições, por grupos de votantes, aproxima as características de cada um, no que, por exemplo, ao nível de escolaridade diz respeito; de um ou outro candidato. Já para não falar na abstenção que prejudica, muitas vezes, o candidato que se pensa ter, à partida, a eleição garantida. 
Foi isto, por alto, que disse à minha filha. Mas as explicações não serviram de muito! E o que é facto é que as brincadeiras dos últimos meses à volta de Donald Trump, hoje, não pareciam ter mais piada. Depois de Obama os americanos escolheram Trump. Pode ser que daqui a algum tempo estejamos a analisar a actuação do futuro presidente e se chegue à conclusão que as nossas perspectivas eram demasiado pessimistas. Mas hoje, perante esta realidade, só mesmo as lágrimas fazem sentido.

domingo, 6 de novembro de 2016

Ininteligível

A sua voz pouco se fazia ouvir na estação de metro cheia de gente. Pedia para a alimentação e para a higiene. Eu estava sentada a ler. Quando passou por mim baixou-se e disse-me que tinha escrito 35 livros que nunca ninguém publicou. De seguida disse ainda qualquer coisa que não entendi sobre o Campo de Santa Clara. 

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

No dia 1 de Novembro

As flores estavam frescas e as pedras de mármore brancas estavam limpas. O dia quente e cheio de sol levou muitos a aproveitarem para "visitar os seus mortos". O que alguns consideram um ritual um pouco macabro e sem qualquer préstimo só cumprido por quem, sendo católico, vai ao local rezar pelas almas dos que partiram, é, na realidade, uma situação absolutamente natural que faz parte do mundo dos vivos. O culto dos mortos, aliás, diz-nos muito deste mundo.
Enquanto nos outros dias as visitas ao cemitério se fazem de forma mais discreta, num contexto mais pessoal, neste dia (que apesar de não ser “Dia de Finados” é comummente o da romagem aos cemitérios) a azáfama é grande. É preciso assegurar que tudo fica limpo e bonito, mais para ser visto pelos amigos e conhecidos do que pelos que já não podem observar o resultado final. Mas é a partilha comum de sentimentos que unem os humanos nas suas experiências de perda que parece mais significativa neste dia. Todos e cada um dos que ali estão recordam uma ou mais pessoas, os seus rostos, as suas vozes, as experiências vividas em conjunto. Simultaneamente para os outros essas pessoas são apenas nomes gravados na pedra. 
E se uns são mais discretos, outros, como os membros das famílias ciganas, fazem deste um momento de convívio ruidoso e de união. Com os jazigos abertos, sentados em bancos dispostos à sua volta, estão as mulheres. Os homens, em pé, conversam. As crianças brincam e andam "ao pão por Deus". E ali passam algumas horas.
Eu, que há já alguns anos não ia ao cemitério neste dia e que tenho a maior parte dos "meus mortos" longe, senti-me bem. Relembrei situações e pessoas: os meus padrinhos, José Bernardo e Maria Inês; a D. Alice, o Sr. Silvério, a Clarinha e o Sr. António. Chorei e sorri junto a eles. Vivi mais um pouco da minha vida. 

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

"I don't need a reason For what I became"

Quando se tem 82 anos e se é cantor é difícil fazer com que a voz corresponda àquilo que as canções merecem. 
Mas quando se tem 82 anos e se é poeta, um grande poeta, parece fácil moldar a forma como os poemas correspondem à nossa vida.

I'm leaving the table
I'm out of the game
I don't know the people
In your picture frame
If I ever loved you
It's a crying shame
If I ever loved you
If I knew your name

You don't need a lawyer
I'm not making a claim
You can put down your weapon
I'm not taking aim
I don't need a lover
The wretched beast is tame
I don't need a lover
So blow out the flame

There's nobody missing
There is no reward
Little by little
We're cutting the cord
We're spending the treasure
That love cannot afford
I know you can feel it
The sweetness restored

I don't need a reason
For what I became
I've got these excuses
They're tired and lame
I don't need a pardon
There's no one left to blame
I'm leaving the table
I'm out of the game

Leonard Cohen - Leaving The Table Lyrics




sábado, 29 de outubro de 2016

. . . _ _ _ . . .

Na TVI 24, à hora dos telejornais, temos agora um novo programa de televisão. SOS 24 dá notícias relacionadas com as actividades das polícias e é uma versão televisiva de qualquer coisa tipo "Jornal O Crime". Já por duas ou três vezes vi uns bocados. Como não podia deixar de ser os casos mais mediáticos dos últimos dias estão em destaque. Para além da apresentação dos supostos factos, têm também comentadores em estúdio. Estes, com um ar muito compenetrado e profissional, dizem umas banalidades e dão umas opiniões facilmente suplantadas, em termos de coerência e fundamentação, pelo empregado do café da esquina da minha rua. O problema é que parecem levar-se mesmo a sério. Por isso é ainda mais constrangedor ouvi-los...

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Uma ilha

Um filme ou, neste caso, um documentário, pouca diferença faz.
Lampedusa, a ilha, torna-se cenário, não por escolha de um realizador, mas por ser ali que se desenrola uma das mais penosas realidades dos nossos dias. De todos os que tentam chegar à Europa muitos são os que nunca chegam a embarcar na direcção desta ilha. Uns ficam no deserto numa travessia que, com poucos meios, frequentemente é fatal. Outros não conseguem ultrapassar a Líbia, as suas prisões e os maus-tratos. Para os que conseguem juntar o dinheiro necessário para pagar a quem organiza as viagens para o desconhecido, entrar naqueles barcos é uma etapa chave. Fugir de uma vida indescritível na sua dureza e onde a morte parece querer levar sempre a melhor leva a considerar possível aguentar as condições da viagem. Mas a verdade é que, para muitos, sobretudo para os mais pobres que só têm dinheiro suficiente para ocupar os fundos daqueles barcos (mais uma vez o dinheiro como factor determinante), é exactamente a morte que encontram neste caminho entre dois continentes, um que não os quis e outro que não os quer.
Lampedusa não tem importância nenhuma para os mortos que ficam pelo caminho. Mas também pouca diferença faz para os milhares de pessoas que, depois de inúmeras provações, ali chegam em condições deploráveis e que são registados e enviados para outro sítio, que o espaço ali é limitado. Os barcos que os recolhem, as camionetes que os transportam, os centros de acolhimento que os recebem, estão ali como podiam estar em qualquer outro lugar que ficasse a meio de um caminho de fuga e esperança.
Mas para as pessoas que vivem na ilha, Lampedusa é a sua casa, lugar das suas memórias. Os campos açoitados pelo vento, o mar, fonte de riqueza que sempre fez parte da sua história, os locais de brincadeira, a estação de rádio local com uma relação de proximidade feita de muitos programas de discos pedidos. Aqui a vida corre como sempre, sem grandes sobressaltos. As recordações negativas que o mar traz são associadas ao duro trabalho da faina da pesca ocupação que, para os mais pobres, se traduz numa vida de sacrifícios e de receios acerca do futuro. A vinda de migrantes que ali chegam à Europa já não é novidade. Mas só nestes últimos anos, a dimensão desse fenómeno se tornou avassaladora.
No documentário só o médico de Samuele, rapaz da ilha a quem acompanhamos do princípio ao fim, parece tocado pela realidade da chegada destes homens, mulheres e crianças a quem pouco interessa o nome do local. No seu caso, porque lida directamente com a situação, é ferido intensamente por ela e apercebemo-nos que as marcas que deixa serão impossíveis de ultrapassar. Mesmo assim, na sua actividade de médico local, nada deixa transparecer. Parece querer proteger dele todos os que não testemunham o horror vivido ali tão perto. 
Mesmo assim, quer os que vivem na ilha quer os que, como nós, só vêem as imagens pela televisão não podem ficar indiferentes. Mas nunca temos a verdadeira noção do que realmente se passa. E este documentário aprofunda essa noção. Mesmo que não fosse por mais nada já valia a pena vê-lo.

terça-feira, 25 de outubro de 2016

História... com sol e palmeiras

Li esta semana, pela primeira vez, o conto "O Pierrot que nunca ninguém soube que houve" de Almada Negreiros.
Fiquei a pensar que teria gostado que alguém mo tivesse lido enquanto eu tinha idade para acreditar em princesas, pierrots e arlequins...

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Go, go, confessor go!

Uma súbita vontade de se confessar? Agora já não precisa procurar uma igreja e consultar os horários das confissões. Vamos ver como se compatibiliza a noção de tempo que, na religião, é da ordem do metafísico e do divino com a procura e escolha "em tempo real" de um confessor...O "exame de consciência de última hora" parece ser, também, um "must"... 

domingo, 16 de outubro de 2016

A dor de Julieta

Quando vemos um filme como Julieta percebemos porque é que o cinema é uma arte maior e Almodóvar um grande realizador.
Uma mulher com uma enorme vontade de amar que não se traduz na capacidade real de amar. A dificuldade em lidar com as consequências dessa incapacidade traduzida em culpa e remorso. A complexidade dos sentimentos, num filme simples, sem artifícios, uma história absolutamente credível e próxima de cada um de nós. Os actores estão também à altura das personagens que interpretam e nos seus olhos podemos ver aquilo que não precisam dizer.
Por estas razões, que para alguns não serão válidas, mas sobretudo porque nos sentimos aquela mulher, sabemos que este será um dos filmes da nossa vida.

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Explicações impossíveis

Ontem, M. telefonou-me num estado de grande agitação. Estava com um grupo de colegas e não sabiam o que pensar. O que se pode dizer a uma filha que acabou de ler uma notícia como esta? Lembrar-lhe que os títulos dos jornais apelam sempre para o lado sensacionalista das notícias? Que a construção de abrigos é uma prática antiga e muitas vezes é uma afirmação de segurança para o interior e exterior do país? Que, desde a segunda guerra mundial, já aconteceram crises bastante complexas, nesta "paz mundial" que tem deixado de fora dos conflitos mais sérios os países mais poderosos? Que a situação na Síria se há-de resolver, sem que se alastre mais a tragédia diária que ali se vive? Que a divulgação de poderio militar e movimentações de tropas são demonstrações de força que visam criar uma ideia de superioridade de um país? Que os "avisos" difundidos por meios diversos são muitas vezes para consumo interno? Que os governantes dos países em causa estão conscientes dos perigos e trabalharão para que as soluções pacíficas prevaleçam?  Que existem organismos internacionais que foram criados com o objectivo de impedir que volte a acontecer uma nova guerra mundial? Que tudo o que o ser humano aprendeu até hoje não poderá ser esquecido? 
Poderia dizer-lhe tudo isto. Mas, à noite, quando me voltou a falar no assunto, tive medo de não parecer convincente e utilizei o humor, salvação nestas alturas em que quase tudo o resto falha. 
Na verdade espero (no sentido do desejo e da esperança) nunca ter que falar desta questão, sem que consiga, pelo menos de forma natural, utilizar este mecanismo de desconstrução de uma realidade que parece cada vez mais difícil de explicar.

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

"You’ve got to have a wristband"

No dia em que a Academia Sueca comunica a sua decisão de atribuir o Prémio Nobel da Literatura a Bob Dylan (facto acerca do qual, depois de ter lido tanta coisa, não tenho nada a dizer) fica aqui uma canção com um belo poema de um senhor que fez hoje 75 anos: 

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

No top do mercado negro dos livros

Ao final do dia entrei numa livraria para comprar um livro para oferecer de presente a uma amiga. Levava três opções em mente. Só uma delas estava disponível. "O Torcicologista, Excelência", de Gonçalo M. Tavares. Foi esse que trouxe. Ao pagar, e enquanto a empregada que estava na caixa embrulhava o livro, disse-lhe que esperava que tivesse tirado o alarme para não apitar à saída o que já me aconteceu algumas vezes em várias livrarias. Respondeu-me que não. Naquele livro não põem alarme. E acrescentou: "Se fosse o último do José Rodrigues dos Santos..." 

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Do comboio vejo menos Tejo

É já tarde neste sábado de princípio de Outono e a noite chega um pouco mais cedo. Os holofotes estão ligados e é a essa luz que dezenas de trabalhadores transportam materiais e máquinas, colocando-os no seu lugar e usando-as para que tudo o que ainda falta fazer fique concluído. E parece ser tanto! Para quem, como eu, passa por ali, é difícil acreditar que daqui a 4 dias estará tudo pronto. Mas, como em tantos e tantos outros casos, não duvido que sim. O novo museu ali ficará à disposição de quem o queira visitar. Dizem que a Fundação tem dinheiro para aquilo e muito mais. Dizem, o que para já me parece verdade, que é um belo edifício, projectado com inteligência pelo atelier londrino de Amanda Levete. Já frases como: "Restaurando a ligação histórica entre a cidade e a água, o edifício cria um destino para os lisboetas, bem como para os visitantes culturais e turistas, reabilitando para todos a zona ribeirinha" ou "O projeto irá renovar o acesso ao rio Tejo a partir da cidade e consolidar a regeneração urbana global do bairro"; que li aqui, me parecem largamente exageradas. 

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Nunca imaginámos...

...que iríamos chegar aqui e que fosse possível haver tanta gente para quem este debate é crucial...

Cartoon na The New Yorker

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Queixas a metro

Depois de descer as escadas que, nos últimos tempos, de rolantes só têm o nome; a visão que hoje de manhã se tinha, a partir do lanço que leva à plataforma da estação de metro do Cais do Sodré, era impressionante. Em 30 anos de frequência do metro de Lisboa poucas foram as vezes em que vi semelhante espectáculo e sempre por razões que se prendiam com algum acontecimento particular. Certo é que a quantidade de gente naquela plataforma era tal que parecia que só mais um iria empurrar alguém para a linha. Quem descia a escada sentia-se assustado e muitos paravam. 
Entretanto lá chegam as 3 carruagens que, a custo, levariam a maior parte dos passageiros. O condutor mal pára logo apita para apressar os que, depois do tempo que estiveram à espera, ainda hesitavam em entrar nos compartimentos apinhados. Eu própria pensei que talvez fosse melhor esperar pelo próximo mas, dada a dúvida em relação ao tempo que esperaria, lá arrisquei. Lá dentro, enquanto as pessoas se arrumavam, muitos comentavam a situação e lamentavam o estado a que chegou um transporte que já foi bom. 
Lembrei-me então que, neste dia 22 de Setembro, se comemora o dia europeu sem carros... Será que muitos dos que habitualmente andam de carro resolveram usar o transporte público? Duvido bastante. Mas, se assim foi, certamente muitos foram afugentados e pensarão: o que vale é que o dia europeu sem carros é só uma vez por ano... 
Quanto aos utilizadores que diariamente entram nas estações do metropolitano e vêem escadas que não funcionam, pessoas a mais, tempos de espera que aumentam, e ouvem os, cada vez mais frequentes, pedidos de desculpa pelos incómodos causados devido a problemas na circulação; resta-lhes apreciar a beleza de algumas das obras de arte presentes. Mais uma vez a arte nos ajuda a superar a realidade...

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

"We could disconnect the telephone"

Entre os que estiveram presentes ontem no Centro Cultural de Belém muito poucos teriam a ver com os que, há 30 anos atrás, sabiam de cor as canções que Lloyd Cole tão bem sabia escrever. Na altura era o nome dele que estava à frente, o que sobressaía frente aos Commotions, o maior responsável pelas emoções que nos abalavam.
Agora estamos todos mais velhos. Ele e nós. A maior parte mais polida, com roupas mais convencionais e a exibir os telemóveis de último modelo que os funcionários do CCB se apressavam a censurar cada vez que os clarões dos flashes iluminavam, à vez, certas zonas da sala. O registo de imagens não era permitido mas muitos queriam aprisionar aquele momento que lhes devolvia um Cole aparentemente desprotegido num palco tão grande mas cheio da segurança que a música lhe dá. É preciso coragem para se expor daquela forma, aceitando as fragilidades que eventualmente possam tornar-se perceptíveis.
O seu filho que, fisicamente, é uma cópia daquele Cole que nos anos 80 fazia suspirar as adolescentes, esteve à altura de todos os temas e, na segunda parte, sempre num plano recuado em relação ao pai, foi um cúmplice respeitoso, nunca tentando acompanhar a letra mas tocando guitarra com elevação.
Quanto a Lloyd Cole mostrou-se tímido, como sempre nos habituámos a ver mas, ao mesmo tempo, à vontade no seu papel de visitante de uma cidade que conhece há muitos anos e da qual guarda já memórias que lhe permitem algumas notas de humor. O público pareceu-me demasiado frio embora nos temas mais conhecidos tenha acompanhado, cantando, mas nunca se sobrepondo ao autor, numa atitude de alguma deferência.
No meio da contenção que se sentia na sala foram as canções que sobressaíram. Podíamos estar sentados, aparentemente calmos, mas, por dentro, havia um fogo que ora nos fazia recuar no tempo, ora nos colocava ali perante o nosso presente, perante o privilégio de partilhar estas canções despidas de artifícios, belas e cruas.

P.S. Como já se percebeu gostei bastante mais do concerto de ontem do que o que vi naquele dia em Sintra.

sábado, 25 de junho de 2016

Quadras ao gosto popular

Num belo e quente dia de Verão
ficámos reduzidos a 27.
Ao remain, os ingleses disseram não.
E com eles ninguém se mete.

Nos mercados, instabilidade.
A libra a cair a pique.
Se vier mais austeridade
emigramos para Reiquiavique.

Schuman, Adenauer, Monnet
O vosso tempo ficou lá atrás.
A acreditarmos no que se lê
foi um sonho bem fugaz.

Escócia e Irlanda do Norte
quiseram fazer a diferença
mas com tanta falta de sorte
compraram uma desavença.

Mudança, já, em Bruxelas,
reclamam muitos, alto e bom som.
Não queremos mais querelas.
Vamos tocar no mesmo tom!

Portugal cheio de medo
está mais do que vulnerável.
Subiram os juros da dívida bem cedo
para um nível intolerável.

Que havemos de fazer ao déficit,
ó meu rico São João?
Lá pelo reino que foi unido ganhou o brexit.
Mas que se lixe: hoje joga a selecção!

quinta-feira, 23 de junho de 2016

E entretanto no Reino Unido...

O estudo de opinião da YouGov diz-nos qual parece ser o comportamento dos eleitores por áreas geográficas nesta questão do ir ou ficar na UE. A coisa está bastante renhida. 






Cartoons aqui e aqui.

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Agora também porta-voz da selecção

"Por três vezes estivemos a perder e três vezes recuperámos..."
"Jogámos contra uma equipa que é forte, mas que quis acima de tudo segurar o resultado. Estivemos a perder por 1-0, 2-1 e 3-2 e tivemos a 'genica' necessária para reagir e recuperar sempre. Tivemos 20 a 25 minutos excepcionais de 'genica"..."
"Agora há que descansar, temos um jogo muito difícil em Lille, frente à Croácia...".
E não, não foi um dos jogadores da selecção a proferir tais palavras. Foi o Presidente Marcelo, na "zona de entrevistas rápidas". 

A terminologia futebolística

...e uma vontade súbita de regresso levou-me a deixar aqui uma das músicas que mais tenho ouvido nos últimos tempos. É impossível ouvi-la só uma vez...

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Numa semana de vitórias

Quando era criança, passava muito tempo em casa dele. Nas horas em que os meus pais não estavam era lá que eu ficava. Mesmo aos fins de semana era frequente irmos dar um passeio. O carro, um carocha, que permaneceu o carro da família até ao fim da sua vida, levava-nos, muitas vezes, ao Estádio Nacional. Às vezes íamos só passear por ali, apanhar ar, como ele dizia. Outras, aos passarinhos, prática censurável agora mas que, na altura, era relativamente comum. Ele gostava de atletismo e as provas no campo principal ou os treinos nos outros campos eram uma boa maneira de passar o tempo. Foi nessas tardes que percebi que também eu, como ele, seria do Benfica. Até hoje. Mesmo que o meu padrinho tenha desaparecido das nossas vidas já há 18 anos. Esta semana, mais uma vez, ele teria ficado muito contente. Não há uma única vitória do nosso clube que não me traga à memória aqueles momentos.

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Uma família americana

Dada a complexidade do processo para a eleição presidencial nos EUA, os resultados finais conseguem ser, por vezes, surpreendentes. E, desta vez, é, desde logo, a definição dos candidatos dos dois partidos que tem levantado questões que são, de alguma forma, novas. O fenómeno Trump é um dos casos que, sem dúvida, irá motivar a realização de muitos estudos na área da sociologia eleitoral. Deixando de lado aquilo que é afinal o mais importante: as suas ideias políticas; atentemos no conjunto de fotografias publicadas neste site (não sei se se trata de uma revista nem quais as circunstâncias da sua publicação original). Nelas o casal Trump e o seu filho, posam para a câmara, na sua casa de Nova Iorque. Aparentemente são imagens de 2010 pelo que não sei se a produção da altura se repetiria agora. Mas, pelo que se sabe, não seria impossível. 
São 51 imagens de pura exibição de uma vida luxuosa que só poderá ser considerada em escalas aplicadas a um número ínfimo de famílias em todo o mundo. Claro que o cultivo dessa imagem, no mundo de negócios de Trump, poderá fazer sentido. Já quando pensamos num candidato a presidente de um país (mesmo que esse país seja os EUA) custa-nos enquadrar em qualquer quadro de referência aquela penthouse e tudo o que nela existe, desde os lustres cintilantes até às limousines e aviões com que Barron brinca; o helicóptero que se vê fora da janela; a quantidade de sapatos de Melania que talvez não chegue ao número de Imelda Marcos mas que impressiona; e muitos outros pormenores que chegam mesmo a chocar.
Pode-se argumentar, claro, que os presidentes anteriores fizeram o mesmo numa medida mais proporcional à sua riqueza pessoal e que os ranchos, os cavalos ou as casas de férias poderão valer tanto ou mais que tudo o que nos é dado a ver nestas fotografias; ou que essa exibição é comum a muitos membros de famílias reais, herdeiros de impérios comerciais, etc; ou ainda que muitos, como grandes traficantes de droga ou armas, só não o fazem porque não podem. Tudo isso pode ser verdade. E a publicação destas imagens agora poderá ter sido propositada, para causar um efeito negativo. Mas não é certo que tal aconteça, se pensarmos numa certa tendência para, em algumas situações, os eleitores aderirem, mesmo que no imaginário e de forma menos consciente, a um estilo de vida que muitos consideram de sonho. 
Pelos vistos nas eleições primárias este estilo não foi um problema. Para mim a sensação de estar a ser agredida por esta ostentação é suficiente para me deixar bastante incomodada e a falta de pudor a ela associada assusta-me. 

A idade nas idades

Por uma circunstância particular do meu percurso escolar, praticamente sempre fui a mais nova, quer nas escolas por onde passei, quer depois na vida profissional. Para mim sempre foi um motivo de regozijo e sobretudo uma oportunidade de aprender com os mais velhos e mais experientes.
Agora, com a passagem do tempo e o avançar da idade, estou naquela fase em que essa realidade se começa a inverter. Em determinadas situações, numa reunião, por exemplo, dou por mim a ser a mais velha. Não é que sinta demasiado o peso da idade; é só a estranheza da constatação, uma situação absolutamente inelutável que se a uns causa alguma ansiedade a outros deixa de rastos. Mas a todos suscita, pelo menos, alguma reflexão. 
Para nos ajudar a visualizar a coisa, Nathan Yau, um estatístico, resolveu fazer, com base em dados do "American Community Survey", um gráfico (na realidade são 3 - para homens, para mulheres e para os dois sexos) onde conseguimos ver, em termos percentuais, quantas pessoas mais novas e mais velhas existem em cada momento da nossa existência. Se for feito com os dados mais adequados pode ser muito útil. De um ponto de vista pessoal é um exercício interessante. Por exemplo, de acordo com os dados utilizados (as diferenças demográficas serão significativas, certamente), para uma mulher com a minha idade, existiriam 35% pessoas mais velhas e 64% mais novas (o equilíbrio teria sido atingido por volta dos 38 anos). Pois...

sexta-feira, 6 de maio de 2016

Uma guitarra a menos

Eu que já há tanto tempo não punha um disco de Prince a tocar; que a última vez que ouvi uma música sua foi numa festa em que dancei ao som do Kiss; que da sua extensa discografia tenho apenas dois LP's e um CD; que nunca o vi ao vivo; que não sei de cor a maior parte das canções; que a única que ainda sei na totalidade não foi cantada por si; que me irrita um pouco aquela forma de usar números e letras para representar palavras; que tendo a criticar o excesso de referências ao desaparecimento de determinadas figuras do meio artístico a quem, de repente, toda a gente deve alguma coisa ou onde foi beber uma qualquer inspiração; pois eu, mesmo assim, também sinto que quero deixar aqui uma referência à sua imensa arte. Como não me consegui decidir por nenhuma das suas músicas fica aqui uma canção de George Harrison tocada por um grupo de excelentes músicos e onde se destaca a guitarra de Prince.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

O poeta ministro

Não faço ideia se Luís Filipe Castro Mendes será um bom ministro da Cultura. Sei que é um poeta de quem gosto (já aqui apresentei uma das razões). Esta exposição pública de um poeta que poucos conheciam trará certamente um aumento de vendas dos seus livros que agora se vêem em lugares de destaque nas livrarias. Isso será positivo para o próprio mas o mais importante é que poderá despoletar interesse na leitura de alguns poemas por parte de pessoas que não costumam fazê-lo, como gosto de pensar que acontecerá.
Em muitos meios li a expressão"ministro poeta". Mas parece-me que faz mais sentido "poeta ministro". Um ministério, mesmo da cultura, é um ministério. A poesia pertencerá sempre a uma outra ordem, superior e permanente. Luís Filipe Castro Mendes é por agora ministro. Mas era, é e será poeta.

Um parlamento um pouco mais equilibrado

Não faltarão vozes contra o facto de só existirem associações ligadas a dois clubes quando a Assembleia é de toda a República. Seria interessante, aliás, sentar os deputados por preferências clubísticas para vermos como ficaria a repartição das forças. Mas agora não ponham Ferro Rodrigues a arbitrar partidas... Mesmo que os fiscais de linha tenham grandes capacidades na detecção dos fora-de-jogo...

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Um Urso e uma Valsa

No meio de tanta porcaria que o facebook nos sugere, às vezes temos destas surpresas:



E que bela surpresa!

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Não é mesmo...

Os dois teriam cerca de 16 anos. Vinham a conversar no autocarro. Ao passarem no bairro, junto à CRIL, que teve a sua origem durante o Estado Novo, a rapariga diz para o rapaz: 
- A Maria diz que aqui é o Bairro Alto
- Não, responde o rapaz, o Bairro Alto não é assim...

quinta-feira, 31 de março de 2016

Liberdade e verdade: tão longe

Nunca fui a Angola. Aliás nunca estive em África. Não foi para lá que os meus pais escolheram ir quando quiseram fugir da vida dura da aldeia onde nasceram. Nunca visitei a família que lá tinha nem a que continuo a ter. Não fui a Marrocos no início da idade adulta, como alguns amigos meus. Nunca passei férias em Cabo Verde. O mais próximo que estive desse continente foi quando, numa viagem pelo Sul de Espanha, andei pela zona de Gibraltar. 
Mas em todos os (ou em muitos) portugueses a ligação a alguns países africanos é evidente e alicerçada na História e em histórias individuais significativas. Mesmo assim, temos muita dificuldade em compreender muitas das coisas que se passam ali. São factores geográficos, históricos, antropológicos, que nos impedem de nos colocarmos no lugar dos africanos. São os factores económicos e políticos com contornos diferentes dos que guiam por aqui estas actividades. A mesma língua, as ligações familiares, as relações de trabalho, os negócios de grandes empresas que se entrelaçam cá e lá estão, no entanto, demasiado presentes para que nos possamos afastar do que se passa nesses países.
E esta semana, em Angola, aconteceu algo que podia ser descrito como incrível, inesperado, inimaginável mas que afinal, tendo em conta o que se sabe do regime angolano, não é nada dessas coisas: 17 pessoas foram condenadas a penas de prisão porque, diz o tribunal de Luanda, planeavam uma rebelião e portanto eram criminosos. Quem acompanhou o processo (e não era membro do tribunal, claro) destaca que, durante o julgamento, não foram apresentadas provas que justificassem as penas aplicadas. Pelo que se sabe de concreto aquele grupo de pessoas estavam juntas a discutir e a dar a sua opinião sobre o país e o seu presidente. Sim, foi isso que foi considerado um crime contra a segurança do Estado. A defesa irá recorrer. Mas será possível que o regime angolano se revele permeável aos argumentos e à pressão que lhe chega do exterior? O que é a opinião internacional para os que não consideram a opinião como um direito mas como um delito?
Afonso "M'banza Hanza", Albano Bingo Bingo, Arante Kivuvu, Benedito Jeremias, Domingos da Cruz, Fernando António Tomás, Hitler Tshikonde, Inocêncio de Brito, José Hata, Laurinda Gouveia, Luaty Beirão, Manuel Chivonde, Nélson Dibango, Nuno Dala, Osvalgo Caholo, Rosa Conde, Sedrick de Carvalho cometeram esse "grave delito" e por isso viram-se privados da sua liberdade.
As frases bonitas que se podem dizer e citar a propósito não terão nenhum impacto. Os posts em blogues também pouco terão. Mas, nestes dias, nunca tendo ido a Angola, não sendo eu representante do governo nem do parlamento;  mas apenas cliente de empresas em que o capital angolano está presente e estando a uma distância, física e de contexto político, bem confortável; apetece-me manifestar a minha tristeza não só pela incapacidade de um país lidar com as exigências dos regimes democráticos mas pelo facto de que os que mais deviam defender a verdade, dela se afastam de forma tão gritante. 

Ouvi-lo não será castigo suficiente?

Mesmo que seja por pouco tempo (esperamos!).

quarta-feira, 30 de março de 2016

"...não tinha nada a perder"

É uma foto estranha. Não é difícil perceber que quem quer que a tenha tirado fê-lo a pedido do homem que sorri de forma evidente. Ele usa uma camisa azul clara onde se pode ver o logótipo de uma marca que, se a camisa for genuína, deve ter custado algum dinheiro. Tem também óculos no alto da cabeça e as suas mãos estão colocadas à frente do corpo. É jovem e, segundo nos contam, era passageiro de um avião que fazia um voo doméstico no Egipto e que foi desviado, para o Chipre, pelo indivíduo que está ao seu lado na fotografia. Este, mais baixo, magro e com um ar frágil e muito menos feliz, posa com o casaco e camisa abertos mostrando o cinto de explosivos que afinal eram falsos. Seif El Din Mustafa, de seu nome, terá desviado o avião, porque queria “contactar a ex-mulher” que vive no Chipre. Chamou a sua atenção, certamente, numa atitude que não é inédita.Tirar uma fotografia com um dos passageiros facilmente se enquadraria na sua estratégia.
O que é estranho, nesta história, é a atitude daquele britânico que, mesmo não sabendo se os explosivos eram ou não reais (segundo afirmou, embora um pouco difícil de acreditar se olharmos para o sorriso que exibe), não quis perder a oportunidade de deixar um registo daquela situação para o futuro. E, caso o desfecho da situação fosse outro, ao menos os seus familiares poderiam dizer que o seu estado de espírito era muito mais positivo que o causador da situação que aparecia ali também a olhar a câmara de frente mas com um ar muito mais acabrunhado...
A vontade imensa de registar o que nos acontece que, parece-me, sempre existiu mas que agora é facilitada pelos meios que temos à nossa disposição; poderá levar às situações mais inusitadas. Esta é certamente uma e diz muito da forma como cada vez mais pessoas lidam com alguns acontecimentos que vão marcando estes dias.

sexta-feira, 25 de março de 2016

Em dia de última ceia, a última cena...

Exactamente no último dia da Quaresma quando os cristãos comemoram o lava-pés e a última ceia de Jesus com os seus apóstolos revi um filme imenso. Daqueles que nos deixam cansados mas com a sensação que a poesia e a filosofia também podem ser mostradas no cinema. "Nostalgia" de Andrei Tarkovsky é um filme duro mas belo e intenso. A apresentação de Pedro Mexia acrescentou-lhe bastante. E foi bom ver o Nimas cheio numa noite em que os lisboetas já se preparam para um fim de semana grande. 

A última cena:


Esta é uma liberdade de post pois, na realidade, a última cena não é esta. É aquela em que a câmara se vai afastando deixando a personagem à beira de um pequeno lago, junto à sua casa da infância na sua Rússia natal estando todos os elementos, simultaneamente, dentro de uma catedral italiana em ruínas.

quarta-feira, 23 de março de 2016

Uma certa "esquizofrenia" de linguagem

No novo cartaz publicitário um actor conhecido diz que confia no seu "ótico de família". Refere-se o cartaz ao Instituto Óptico.

quarta-feira, 16 de março de 2016

"O quando" da leitura

É uma autora que associo à minha maioridade. Não a que se liga à idade mas a que é reflexo de um crescimento interior. Este crescimento, feito por saltos, entre avanços e recuos, teve, no meu caso, uma fase de avanço na época em que a li. Dois dos seus livros, "Olhem para mim" e "Hotel du Lac" (comprados no mesmo dia na Feira do Livro) foram lidos entre 1989 e 1990. Há livros que não se recordam tanto pelo que são mas mais pela época em que os lemos e pelas circunstâncias vividas. Acontece isso mesmo com estes.  
Soube agora que Anita Brookner faleceu a semana passada. Em jeito de lembrança deixo uma passagem...
"... Foi então que vi o ofício de escrever como aquilo que era, e é, verdadeiramente, para mim. É a penitência que se faz pelo facto de não se ser feliz. É uma tentativa para alcançar os outros e fazer com que nos amem. É o protesto instintivo, quando se descobre que se não tem voz nos tribunais do mundo, e que ninguém falará por nós. Eu daria toda a minha produção de palavras, passada, presente e futura, em troca de um acesso mais fácil ao mundo, da permissão de dizer: «Eu magoo», «Eu odeio» ou «Eu quero». Ou «Olhem para mim», deveras. E isto nunca o desmentirei. Porque, uma vez conhecida, uma coisa não pode nunca mais ser desconhecida. Apenas poderá ser esquecida. E escrever é o inimigo do esquecimento, da irreflexão. Para o escritor não há qualquer olvido. Somente a infindável recordação."
in Anita Brookner, Olhem para mim, Editorial Teorema, 1988, pág. 95

Ministro-chefe da Casa Civil?

Não deveria ser antes... Ministro-chefe da Casa da Mãe Joana?

terça-feira, 15 de março de 2016

Uma família muito tradicional

Eu sei que fez parte da estratégia dirigida para dentro e fora do partido mostrar a nova líder como uma mulher de família (grande e unida) que, ao mesmo tempo, que comanda a estratégia do CDS, também é uma filha, irmã, mulher e mãe extremosa. Os inúmeros abraços, beijos, (e perguntas que os jornalistas fizeram questão de fazer) aos que lhe são mais próximos, quiseram demonstrar isso mesmo. O contraste com a reserva, a esse nível, do anterior líder é imenso.
Claro que tornar visível o lado familiar de um político não é nada de inédito, mesmo em Portugal. Mas, pelo menos de forma tão clara, não me lembro de tal coisa ter acontecido. Nomes, idades, anos de escolaridade frequentados, etc, dos filhos e sobrinhos, percursos de vida dos pais, a história pessoal com o seu marido, tudo foi apresentado (pelo menos no canal que vi). Os repórteres estavam muito contentes... 
Não pude deixar de pensar que, nesta tentativa de aproximação ao possível eleitorado, se é legítimo considerar que se poderá beneficiar de alguma empatia, esperando que os portugueses que vêem as imagens se identifiquem com aquela felicidade familiar ou aspirem a ela; isso só é capitalizável assumindo que é essa a imagem da família que ainda é preponderante na sociedade portuguesa. Ora todos os estudos indicam que aquela família que vimos ontem, com a sua dimensão e harmonia, com todos a comungarem dos mesmos ideais é cada vez mais rara. E não estou a questionar se é melhor ou pior que a minha ou outra qualquer. Sabemos que Assunção Cristas tem até posições políticas sobre a família que não são as tradicionais no seu partido. Mas a presença no fim de semana, em peso, da sua, apresentando-se de certo modo como o cânone da família conservadora, foi o elemento mais "centrista" de todo o congresso. 

Adeus, Senhor Contente

Tal como ele disse, "ninguém está preparado para a morte". Mas ela acaba por chegar. Hoje chegou para Nicolau Breyner. Todos nós o recordaremos sempre pelas personagens que ao longo da sua vida interpretou. E entre os vários géneros sobressaem os programas de comédia que, nos primeiros anos da RTP após o 25 de Abril, eram bastante inovadores, sobretudo no que toca aos textos.Vistas agora, muitas das situações que protagonizou nesses programas já não nos causam tanto riso. O ritmo da televisão agora é outro e podemos observar alguma ingenuidade na forma como determinados temas eram abordados. No entanto, também nós, os telespectadores, éramos ingénuos. Acreditávamos que uma vez que já se podia falar de certos temas com humor, na televisão, estaríamos mesmo a caminho de nos tornarmos mais felizes e contentes. E nesses primeiros anos de democracia, Nicolau Breyner ajudou-nos muito. Eu, criança, não perdia os seus programas. E tenho a certeza que eles me ajudaram a crescer e a fazer leituras mais humorísticas da realidade. 
Depois o seu percurso diversificou-se. Mas é ponto assente que em tudo o que fez foi um profissional e o seu sucesso faz parte da história do teatro, do cinema e da televisão em Portugal. 
Por tudo o que nos deu só nos resta agradecer e recordá-lo como ele queria: "com um sorriso, com carinho".
Aqui fica, com Eunice Muñoz, no Eu Show Nico:



sábado, 12 de março de 2016

A combinação de duas palavras...

...pode ser o suficiente para nos deixar bem dispostos. À minha volta, no comboio, devem ter achado que eu era tola, tal o sorriso ... Responsável foi esta passagem do livro Submissão de Michel Houellebecq:
"Talvez eu tivesse simplesmente fome, esquecera-me de comer na véspera, e talvez fosse melhor voltar para o hotel, sentar-me à frente de umas coxas de pato, em vez de me afundar entre dois bancos, vítima de uma crise de hipoglicémia mística." 

Papel de regulador. Literalmente.

Vai deixar de ser preciso ir a correr baixar o som da televisão nos intervalos. Já não era sem tempo...

quarta-feira, 9 de março de 2016

Onde está o Marcelo?

Esta minha tendência para defender quem está na mó de baixo tem destas coisas. Nunca gostei do presidente que os portugueses escolheram, por duas vezes, em eleições livres e democráticas, como se costuma dizer. Mas ele foi, com efeito, o mais votado nessas vezes. Agora está de partida e a verdade é que não me lembro de nenhum fim de mandato presidencial com tantas manifestações de satisfação, de júbilo. Mesmo nunca tendo votado nele e criticando tantas das decisões que tomou enquanto primeiro-ministro e presidente, sinto alguma pena quando o imagino a ler, a ouvir ou a ver algumas das coisas que se escrevem, dizem, desenham, por estes dias, sobre ele.
Perante tanto regozijo com a partida do seu antecessor, as expectativas em relação a Marcelo só podem ser altas. Porém, quando estas estão altas demais as desilusões são também maiores.
Mas não vamos, nesta fase, ser pessimistas. Mesmo não sabendo o que os próximos anos nos trarão temos um presidente novo. E hoje, mesmo quem não votou Marcelo, tem razões para estar contente com a partida de Cavaco Silva. É que, até no meio de tantos cavaquinhos, sobressai o machete de braga...



Sentada

                              Vilhelm Hammershøi, Interior with Ida in a White Chair, óleo sobre tela

quinta-feira, 3 de março de 2016

O dia imperfeito de Kafka...

... é uma perfeição literária.

"Estávamos talvez naquela pausa muito pequena e sossegada entre o dia e a noite em que a cabeça, sem que o esperemos, está presa ao nosso pescoço e em que tudo, sem que o notemos, está parado, porque não reparamos e depois desaparece. Em que ficamos sozinhos com o corpo arqueado, depois olhamos à nossa volta mas já não vemos nada, deixamos até de sentir a resistência do ar, mas agarramo-nos interiormente à recordação de que existem casas, a uma determinada distância, com telhados e felizmente também com chaminés bicudas através das quais entra o escuro para dentro das casas, que atravessa os sótãos até aos diferentes quartos. E é uma sorte amanhã ser um dia em que, por incrível que pareça, se conseguirá ver tudo."

"Conversa com o Bêbedo" in , Franz Kafka, Os Contos, 1.º Volume, Assírio e Alvim, 2004, págs. 339 e 340

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Parabéns, TSF!

O meu pai era radiotelegrafista. Por isso a sigla TSF era-me familiar desde a infância. Quanto à rádio que faz hoje anos, não sei bem quando comecei a ouvi-la. Mas deve ter sido logo no início. Muitos foram os programas que fui acompanhando ao longo dos anos. Por ser impossível falar de todos destaco os de humor (os textos do Herman que são já peças históricas) e os Sinais do Fernando Alves. Ainda hoje é a rádio que mais ouço. É aquela que me desperta pela manhã e a que está em primeiro lugar na memória do rádio do carro. 
Muitas vezes damos parabéns só porque tem que ser. Neste caso os parabéns são sentidos. 

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

É um combinado número...

No sábado passado, uma sessão de cinema tardia e alguma fome levaram-me ao Galeto. Gosto de lá ir de vez em quando. Agrada-me o espaço e comer um combinado que se pede pelo número acompanhado de uma imperial. Mas a verdade é que os preços são muito altos para o que se come (agravado pela diferença a partir das 22 horas) e a forma como somos atendidos também nem sempre é a melhor. 
Bem, mas como está a fazer 50 anos perdoam-se algumas coisas menos boas. Da próxima vez, quando me sentar ao balcão, talvez tenha sorte com o empregado.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

A ver passar os comboios

                                                         Foto aqui

O filme tem já 20 anos. Para alguns ele só dirá algo a um público específico. Para outros é uma obra prima. Houve quem o quisesse censurar e quem o quisesse apresentar de um ponto de vista pedagógico. O seu mérito, parece-me, é não haver nele a perspectiva da droga enquanto problema de saúde pública, de segurança, por via dos crimes associados ao seu tráfico, enquanto causa de destruição familiar, ou outra mais comum quando se aborda este tema. Aqui a droga, do ponto de vista das personagens, é uma escolha, um caminho possível para a felicidade. Os juízos de valor ficam para quem está de fora. Permite pensar, analisar, discutir. E apesar de datado não está desactualizado. 
E se o filme não está desactualizado muito menos a sua banda sonora que ainda hoje ouço com o mesmo prazer.


sábado, 13 de fevereiro de 2016

Mark Rylance

Ainda não vi o filme "Bridge of spies" (nem "O Legado de Rocky"). Mas este ano os nomeados para melhor actor secundário nos Óscares vão todos muito bem. No entanto, se é verdade que gostei tanto de Tom Hardy sei que Mark Rylance é, há alguns anos,  um dos meus actores favoritos. Aqui está ele com outro grande actor, Stephen Fry, numa cena da magnífica produção do Teatro The Globe para a peça de Shakespeare, "Twelfth Night" (que vi há pouco tempo na RTP2).

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Sucessor à altura?

Ainda na sequência do post anterior: 
Deixe lá Pedro Chagas Freitas! Quem sabe para o ano...
Depois da leitura destes trechos de um livro que podemos encomendar já autografado e cujo título, Eu Sou Deus, constitui certamente uma aproximação ao pensamento filosófico de Santo Agostinho, fiquei com a certeza de que este autor está certamente muito bem posicionado para chegar lá:
"O que mais dói é a subfelicidade (...) A subfelicidade é o piso -1 da felicidade. E não há elevador algum que te leve a subir de piso. Tens de ser tu a pegar nas tuas perninhas e a subir as escadas. Anda daí (...) Espero que estejas bem seguro nessa cadeira quando leres o que aí vem no próximo parágrafo. (...) A felicidade, quando é felicidade, é só felicidade. E tudo o que existe, quando existe felicidade, é a felicidade. Só ela e tu. Ela em ti. Ela em todo o tu." 
Excertos de um texto mais longo que me chegou via Facebook 

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Depois disto só o Nobel...

Para lá do título da notícia em que um pronome demonstrativo resume todo um nome parecendo que, quem redigiu a notícia, não o queria pronunciar ficámos a saber que uma entidade que atribui uns tais Prémios Cinco Estrelas tinha elaborado um questionário e perguntado a 28 mil portugueses (ena tantos!) quem é o melhor escritor do país. Parece que uma das variáveis a ter em conta era a "qualidade da escrita". Ora, partindo do princípio que a notícia é fidedigna e que uma "amostra" de 28 mil portugueses não é uma coisa de somenos, ficamos então a saber que "José Rodrigues dos Santos é considerado pelos portugueses o melhor escritor nacional".
Mas analisando melhor a forma como o prémio funciona colocam-se várias questões: foi o próprio a candidatar-se? Havia mais concorrentes na sua categoria? Quem constituía o "comité de avaliação"? Os "testes de experimentação" consistiam exactamente em quê? Será que não houve uma troca dos "questionários de avaliação massificada" com algum dos produtos de marca registada concorrentes?...
O que me preocupa no meio disto tudo (eu que já li contracapas e algumas passagens dos seus livros - isto para não dizerem: - lá estão estas pessoas a falar mal do que não conhecem) é que um dos benefícios dados aos vencedores é "um plano de comunicação implementado pela organização do Prémio Cinco Estrelas que inclui Televisão, Imprensa, Exterior e Digital". Livra-te! Ainda mais!?  Queres ver que agora, além do próprio em cartão à porta das livrarias, vamos ter que (à semelhança dos cartões de aniversário com música) o ouvir lendo algumas passagens dos seus "romances"? Bolas! Ou melhor, estrelas!

Os novos filmes para adultos

A OMS lá terá as suas razões. E certamente são válidas e para o bem de todos nós. A Disney já tinha, há algum tempo, decidido não incluir nos seus filmes cenas com personagens a fumar. A alteração de hábitos de consumo de tabaco, objectivo mundial, terá que avançar em várias frentes, é certo.
Por outro lado, na realidade, a classificação de filmes para adultos só dará mais vontade aos adolescentes de os verem. 
Cabe aos pais dar uma opinião. Eu não aconselharia as minhas filhas a não verem filmes por causa dessa situação. E a verdade é que a actriz Lauren Bacall, de quem se fala sempre que se quer ilustrar o assunto, morreu com 89 anos...


                                                        Lauren Bacall no filme Dark Passage, 1947



sábado, 30 de janeiro de 2016

Entre árvores e arranha-céus

Depois de algumas semanas sem ir ao cinema, no fim de semana passado fui ver dois filmes.
Primeiro The Revenant, realizado por Alejandro González Iñárritu, com argumento baseado num romance inspirado na vida de Hugh Glass. 
Confesso que o filme me cansou. As paisagens são esmagadoras na sua beleza, é verdade. Mas com a utilização da tecnologia actualmente disponível não chegamos a perceber bem o que é imagem real e o que não é. A realidade daquela história contribui para reforçarmos a ideia de que tudo é unido pela violência da natureza. Ela está presente no clima, no relevo, no comportamento dos animais da floresta, no comportamento dos humanos. Os sentimentos mais básicos, a sobrevivência que é preciso assegurar estão bem retratados mas não trazem nada de novo quando comparados com filmes mais antigos.
Gostei da interpretação de Leonardo DiCaprio mas Tom Hardy (que há alguns meses vi em Legend, no qual interpretava os gémeos Kray), como John Fitzgerald, é verdadeiramente excelente.


No dia seguinte, A queda de Wall Street.
Apesar do recurso a um artifício (a utilização de figuras públicas que nos explicam o funcionamento dos meandros daquele mundo "como se nós tivéssemos cinco anos") não é fácil perceber tudo aquilo que o filme retrata. É uma linguagem complexa para quem a ela não está habituado e o filme vai avançando a um ritmo vertiginoso o que nos obriga a algum esforço de concentração. 
Gostei mais deste filme. Retrata uma realidade aparentemente distante mas que é capaz de nos afectar em quase todos os aspectos da nossa vida. 



Ambos os filmes se baseiam em situações verídicas e, no fundo, a ideia da sobrevivência e da violência estão presentes nos dois. A paisagem, essa, é um pouco diferente.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Vamos ler Vergílio

"Tenho de. O pequeno intervalo entre a minha disponibilidade e a pequena tarefa a realizar. É o meu futuro. Reduzido minúsculo. Não olhes mais longe. Agora o teu futuro é o pequeno passo que dês para fechar as janelas, para abrir as lojas. Agora a tua vida é o instante em que vives. Nada mais, nada mais, mas não te lamentes. Sê inteiro na dignidade de ti..."
 in Vergílio Ferreira, Para Sempre, Círculo de Leitores, Lisboa, 1985 , pág. 123

Por uma série de situações entre as quais este post do Luís Naves, uma definição de amor citada por um professor das minhas filhas e uma referência de Eduardo Lourenço (outro beirão, como ele) lida numa entrevista a Carlos Vaz Marques dei por mim a regressar ao Para Sempre. Terminei de o ler, pela primeira vez, no dia 5 de Setembro de 1986. É um livro marcante. Foi-o para mim. E certamente, naquela idade, não teria vivido o suficiente para compreender a dureza do confronto com o passado e a inevitabilidade do fim que naquele livro estão tão presentes. Tenho agora algum receio de o reler. Mas ele está aqui ao meu lado. Pacientemente espera pela minha coragem. 
Hoje passam 100 anos desde o nascimento de Vergílio Ferreira. É uma data que merece ser assinalada. A Isabel Mouzinho já o fez no DO. Alguns jornais nas suas versões on line também já lhe fizeram referência. E é a lê-lo que, mesmo que soframos, lhe prestamos a melhor homenagem.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Uma janela enganadora


Paula Rego, "Looking Out" (1997), pastel sobre papel em suporte de alumínio. Imagem aqui.

Podíamos pensar que esta obra retrata "apenas" uma mulher que está a uma janela. Na realidade se dissermos que esta mulher é Amélia, personagem principal do livro "O Crime do Padre Amaro" de Eça de Queirós, tudo se torna diferente. Vemos, então, uma mulher absolutamente impotente para alterar o seu destino, confinada a uma vida marcada pela opressão de uma sociedade tacanha. Talvez Paula Rego (que nasceu num dia 26 de Janeiro) quisesse dar-lhe um pouco mais de liberdade colocando-a à janela e com um pé na cadeira como que a dizer que, se Amélia quisesse, poderia sair para a rua e ser um pouco mais ela própria. Na obra literária do século XIX o fim desta mulher foi trágico. Aqui não tem que ser.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

À atenção de muitos que hoje ficaram no sofá

Estavam no passeio. Ela segurava-o mas parecia que por pouco tempo mais aguentaria o seu peso. As pernas dele tremiam. Abeirei-me deles e perguntei se precisavam de ajuda. Disseram logo que sim. A sua casa ainda ficava um pouco longe. Mas bastava chegarem até à parede para ele se poder encostar que já ficavam bem, pelo menos até à chegada da filha que os vinha buscar. Durante longos minutos tentámos fazer o percurso de pouco mais de 2 metros. A sua mulher de um lado e eu do outro tentávamos ajudar as pernas a avançarem em pequenos passinhos. Mas elas recusavam-se a colaborar. 
Eram já 89 anos e desde que, há alguns meses, um AVC tinha tornado tudo mais complicado pouco saía de casa. Tinham ido votar. Para lá não tinha sido fácil mas com esforço conseguiram. Mas o regresso estava a ser impossível. Falei-lhes nos transportes que os bombeiros e juntas de freguesia costumam fazer em dias de eleições em situações como a sua. Não sabiam disso. 
Numa das pausas do seu esforço para avançar não resisti e comentei: o senhor é um exemplo! Tantas pessoas de boa saúde que passarão o dia sentadas sem irem votar e o senhor, com tanta dificuldade, não deixou de o fazer. Um pouco surpreendido respondeu-me: - Ora, é a minha obrigação!

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

A menos de dois dias da decisão

Deixa-me cá falar das eleições antes que chegue o dia de reflexão...
Há 10 candidatos. Eu recebi 2 panfletos. Vi alguns debates. Vi imagens da campanha que as televisões mostraram. Ouvi tempos de antena. E estas são as primeiras coisas que me vêm à cabeça quando penso nos candidatos:

António Sampaio da Nóvoa - faz bonitos discursos
Cândido Ferreira – talvez seja um bom médico
Edgar Silva – as mulheres, sobretudo as que têm mais de 60 anos, acham-no muito charmoso
Henrique Neto – ideias interessantes mas acho que se esqueceu de fazer campanha
Jorge Sequeira – não consigo ser motivada por oradores motivacionais
Marcelo Rebelo de Sousa – usa sapatos de fivela
Maria de Belém Roseira - o número de lares visitados na primeira semana da campanha rivaliza com o número de cadeiras vazias no comício no Centro de Congressos de Lisboa
Marisa Matias – uma boa campanha mas é preciso chover mais um bocadinho 
Paulo Morais – passaria a viver no Palácio da Justiça em vez do Palácio de Belém dado o número de processos em tribunal 
Vitorino Silva – muitos sentem vergonha alheia perante as suas intervenções mas a verdade é que, estatisticamente falando e por mal dos nossos pecados, ele seria o presidente que mais representaria os portugueses

Ou seja nada que me ajude a tomar uma decisão pelo que continuo a não saber em quem vou votar.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

A morte em partilha

É certo que neste Janeiro de 2016 as mortes de figuras públicas têm acontecido quase diariamente. Já esta noite foi noticiada a morte de Ettore Scola. É de tal forma que, ao ligar o rádio de manhã, me pergunto se mais alguém terá sido acrescentado a esta lista...
Mas este clima em que os obituários se sucedem parece ter dado azo também a uma onda revivalista de obituários passados. No Facebook têm-se sucedido, nos últimos dias, as partilhas de notícias de mortes de pessoas como o historiador Jacques Le Goff ou o nosso querido Vasco Granja. E não faltam logo os comentários sentidos de átrio de capela mortuária. É verdade que há pessoas que farão sempre falta e que tudo o que se puder dizer sobre elas, enaltecendo o seu valor, é sempre actual. Mas, por favor, verifiquem as datas das notícias. Se as pessoas já desapareceram há anos e ainda não tinham dado por nada é porque, de uma maneira geral, o interesse que estas lhes despertavam não era assim tão grande e as frases pesarosas soam tão ocas como os comentários às fotos de gatinhos com olhos grandes.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

A sintaxe na campanha

Não discuto o facto de, na língua portuguesa, tal como em muitas das línguas mais faladas do mundo, haver uma sobre-representação do masculino face ao feminino e que tal matéria do domínio gramatical esteja relacionada com questões sociais associadas ao género, reforçando a invisibilidade das mulheres. Li um post interessante sobre esse assunto aqui.
Mas confesso que em certas circunstâncias, como a da campanha presidencial em curso, é demasiado repetitivo, soa a falso e torna-se absolutamente irritante esta insistência em dizer "portuguesas e portugueses", a que agora se acrescenta também "cidadãos e cidadãs" (ou "portugueses e portuguesas"e "cidadãs e cidadãos" que isto da ordem das palavras também é significativo) e outros pares de palavras no masculino e feminino.
Usar assim os substantivos não dá mais equidade à linguagem. O sexismo está na gramática. Pois. Mas há palavras cuja utilização é a mesma para os dois sexos. Há substantivos abstractos, nomes colectivos. Pode ser difícil, no caso dos habitantes deste país, deixar de dizer portugueses. Mas então digam portugueses! Compensem noutras palavras. A língua portuguesa é tão rica! Nestes 5 dias que restam de campanha usem a imaginação, por favor!

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Vistas as coisas...

a animação está garantida... Ainda é um pouco cedo mas pelo andar da carruagem e pelos passageiros que querem entrar nela as próximas eleições autárquicas em Oeiras vão ser muito interessantes... 

16 minutos de leitura

A leitura de artigos de jornais e revistas através dos sites tornou-se um hábito cada vez mais enraizado. Confesso que eu, se no caso dos livros, até agora rejeitei qualquer outra coisa que não o papel; já no que respeita a jornais e revistas (com poucas excepções) leio bastante o que está disponível on line. E só há pouco tempo reparei que, em algumas publicações, no início dos artigos, entre as várias indicações fornecidas, se encontra o tempo previsto para a leitura. Será certamente uma média. E como será calculada? A primeira vez que resolvi verificar li em 11 minutos uma entrevista que estava indicada como correspondendo a "16 minutos de leitura". Claro que se lesse a seguir, ou noutro dia, ou com um objectivo diferente, o tempo seria outro. Podíamos até fazer muitos exercícios: ler sem interrupções, ler com e sem luz apropriada, com e sem sono, em casa, no comboio... Já para não falar das diferenças de pessoa para pessoa com um dos candidatos a Presidente da República em Portugal a bater todos os recordes... 
É esta ideia de que tudo tem que estar programado, que temos que ter a informação toda disponível, diminuindo as hipóteses de nos perdermos na leitura, de a suspender, sem a liberdade de nos surpreendermos na gestão do nosso tempo, que soa estranho nesta situação.
Imaginemos esta informação aposta nas capas dos livros. Qual a unidade de medida a utilizar? Uma universal? Minutos para pequenos ensaios? Dias para obras como Guerra e Paz de Tolstoi ou Em Busca do Tempo Perdido de Proust?  E as editoras pagariam a "medidores de tempo de leitura" antes dos livros serem lançados ou atribuiriam, automaticamente, uns minutos a cada página? Já estou a ver um cliente numa livraria: "tenho livres as próximas duas horas; o que é que tem aí para esse tempo?".
Mas voltemos à leitura do artigo que me fez lembrar este assunto: bolas, com estes pensamentos, ultrapassei largamente, os 24 minutos previstos...

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

O ano ainda é novo?

É uma questão de somenos. Mas todos os anos tenho esta dúvida: até quando faz sentido desejar um "Feliz Ano Novo"? Sempre pensei que o Dia de Reis seria assim como que uma fronteira. Diz a tradição que é o dia em que as festividades associadas à época natalícia terminam. A partir dele os enfeites de Natal podem ser retirados e guardados nas caixas de onde só sairão no final do ano novo, entretanto já velho. Mas por enquanto o ano que, nesta coisa de votos, anda sempre misturado com o Natal, lembrando-nos a ligação da festa cristã aos ritos de renascimento após o solstício de Inverno, ainda é novo. Os ciclos sucedem-se. E os anos, mais ou menos iguais (este ano é bissexto e por isso tem mais um dia) vão fazendo o seu percurso, indiferentes à quantidade de pessoas que o incluíram nos desejos mais felizes. Uma vez que todos os dias são novos, em teoria, podemos sempre desejar um "Feliz Dia Novo". É o que fazemos diariamente quando dizemos "Bom dia". Mas e o ano? Poderemos dizer, à semelhança do Natal, que ele é novo enquanto um homem quiser? Ao prolongar no tempo estes desejos, parecemos querer tornar mais longa a esperança num período que sabemos ser, apesar disso, igual aos outros que já passaram, com os seus acontecimentos positivos e negativos. Este ano já começou a mostrar o seu lado mais negro. E no entanto tenho a certeza que amanhã ouvirei ainda alguém dizer: "Feliz Ano Novo!"

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Só...?

Não é que as minhas filhas costumem vir até aqui. Mas outro dia, a propósito já nem sei de que assunto, comentei com M. esta ausência de tanto tempo. Mesmo que aquele "só" não seja propriamente animador este foi o seu comentário:
- Eu tinha uma mãe blogger. Agora tenho só uma mãe...

M., 15 anos

Talvez...

Não era isto que eu tinha em mente quando, em Maio de 2009, comecei a guardar, nestes Dias Imperfeitos, as  interrupções que vão pontuando os meus dias. A verdade é que, nos últimos meses, sempre que pensava num post logo o Senhor Palomar que está na minha cabeça se encarregava de o ridicularizar de tal maneira que nem chegava a abrir o separador. E assim foi passando o tempo. O império do Facebook, as visitas cada vez mais raras, também não eram estimulantes. Os blogues, para sobreviverem, precisam de alguma constância, é certo. Mas este registo pessoal e em modo de diário, mesmo que aberto a olhares do exterior, tem-me feito falta.  E se este é um espaço sem obrigações, sem ritmo certo, aberto ao que eu quiser fazer dele, talvez um recomeço seja possível... 

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Que forma de começar o dia... Que forma de começar a semana... Que forma de começar o ano... Que forma de recomeçar o blogue...

Em 1967, ano do meu nascimento, já David Robert Jones sabia que queria ser David Bowie. Era esse o nome do álbum que lançou. Ao longo dos anos, dos nossos anos, Bowie esteve sempre lá. Acompanhou-nos sempre, surpreendeu-nos sempre. Muitas vezes não o compreendíamos porque ele estava sempre à nossa frente, "a mostrar-nos caminhos", a levar-nos além de nós, a fazer-nos crer que podíamos ser muitos. Como ele. Hoje David Robert Jones já não está connosco. Mas Bowie... Procurem-no nos vossos discos de vinil, nos cd's, ou nos dvd's, nas plataformas da internet... Certamente encontrarão muitas razões para perceber que ele ficará por cá. Felizmente para nós, durante muito tempo. Para sempre.

"There is a happy land where only children live
You've had your chance and now the doors are closed sir, Mr. Grownup
Go away sir
Boo, de boo, de boo, de boo dup"

"There Is A Happy Land"
do álbum: "David Bowie" (1967)