quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

“A política como vocação” (continuação III)

“Como aquilo que, naturalmente, fica na memória é a obra jornalística irresponsável por causa das suas funestas consequências, poucas pessoas sabem considerar que a responsabilidade do jornalista é muito maior que a do sábio e que, na média dos casos, o sentido de responsabilidade do jornalista honesto não fica a dever nada ao de qualquer outro intelectual… As tentações incomparavelmente mais fortes que rodeiam esta profissão…

… todo o político importante tinha necessidade de influência sobre a imprensa e de ligações com ela, mas não era de esperar que , salvo algumas excepções, os chefes de partido saíssem das suas fileiras. Temos que procurar a razão deste facto na crescente falta de liberdade do jornalista, especialmente do jornalista sem meios de fortuna… o homem que trabalha no jornalismo tem cada vez menos influência política ao passo que o magnate capitalista da imprensa… tem cada vez mais.

Entre nós, os grandes consórcios capitalistas da imprensa, que se tinham apoderado sobretudo dos jornais com “anúncios redigidos”, cultivavam com extremo cuidado a indiferença política. Não tinham nada a ganhar com uma política independente e, em troca, corriam o risco de perder a benevolência, economicamente rentável, dos poderes políticos estabelecidos. O negócio dos anúncios pagos foi pois o caminho pelo qual… se tentou, e aparentemente se continua a tentar ainda hoje, exercer sobre a imprensa uma influência política de grande estilo. Ainda que se possa esperar que a grande imprensa consiga subtrair-se a essa influência, a situação é muito mais difícil para os pequenos jornais. Em todo o caso… a carreira jornalística não é actualmente… no nosso país, uma via normal para ascender à chefia política…

Enquanto que o jornalista, como tipo de político profissional, tem já um passado apreciável, a figura do funcionário de partido apenas se desenvolveu nos últimos decénios…

… a empresa política é, necessariamente, uma empresa de interessados… os primariamente interessados na vida política, no poder político, recrutam livremente grupos de partidários, apresentam-se eles mesmos ou aos seus protegidos como candidatos às eleições, reúnem os meios económicos necessários e tratam de captar os votos… Isto significa praticamente a divisão dos cidadãos com direito a voto em elementos politicamente activos e politicamente passivos… (págs. 41 a 46)

(o negrito é meu)

(e ainda continua)

3 comentários:

  1. Os patrões da imprensa acabam por ser influentes na influência da opinião pública. Mas, havendo um mínimo de competição, observar-se-á que os tais intelectuais-cientistas - de que falavas num post anterior -, acabam por, no decurso da sua carreira profissional e/ou académica, emitir as suas próprias opiniões desassombradas e de grande independência que mobilizam os cidadãos comuns para uma vigilância crítica e inteligente dos governantes. Vê o caso do Adriano Moreira, do Medina Carreira, do Ernâni Lopes, do Álvaro Domingues (geógrafo).

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  2. "Expedi" o comentário anterior, por lapso, antes de o concluir, pois queria explicitar o argumento de os patrões da imprensa, por facciosos que sejam, terem de acolher a opinião dos intelectuais e cientistas de renome, os quais não se vergam necessariamente à política editorial dos interesses privados. Acresce que, pelo menos por enquanto, na internet podem gerar-se movimentos de opinião distintos da opinião pública dominante. é fundamental a livre concorrência...

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  3. Tens razão, claro. Penso que na altura em que Weber escreveu isto não havia o hábito de tanta gente expressar a sua opinião, da forma como se faz hoje em dia. Actualmente, e ainda bem, há espaços variados para que todos possam expor as suas ideias. Claro que, às vezes, ficamos com a sensação que há pessoas em excesso a falar e a escrever na comunicação social, alguns sem nada de novo ou interessante para oferecerem mas, provavelmente com o tempo, chegar-se-á a um meio termo.

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