“Eu não quis fazer um filme político”, dizia-nos Philippe Lioret, realizador do filme Welcome, no final da apresentação, terça-feira passada, em Lisboa. Mas a verdade é que fez. Não no sentido de ser um panfleto a favor ou contra alguma coisa, mas porque mostra uma realidade que nós sabemos que existe mas a que não prestamos muita atenção, por considerarmos que está longe de nós. Além disso fazer política deve ser entendido, no seu sentido mais lato, da concretização de acções, por parte de cidadãos, que podem vir a afectar a vida de alguém. E este filme, mesmo sabendo nós que raramente um filme muda alguma coisa (reforçando ideias concordantes em quem as tem e sendo normalmente indiferente para os outros), é político.
A antestreia aconteceu num dia em que, em Calais, se verificaram confrontos graves entre as autoridades francesas e os migrantes (i ou e) consoante o ponto de vista. O tema do filme é exactamente a migração à escala do planeta, levando tantas pessoas a arriscarem a vida para não morrerem. No caso concreto a história passa-se em Calais. Aqui mais perto de nós (a ver em A Caminho da Europa) a Espanha assiste a situações semelhantes.
Acompanhamos a história de Bilal, de 17 anos, que vem do Iraque e que quer chegar a Inglaterra onde se encontra a rapariga de quem gosta (em Londres) e o seu clube de futebol de eleição, onde espera vir a jogar (o Manchester United). Em Calais depara-se com a realidade dura de muitos clandestinos que procuram atravessar o Canal da Mancha, pelos vários meios possíveis. Das várias hipóteses opta por atravessar a nado e é por isso que procura aperfeiçoar-se numa piscina onde conhece o seu instrutor que, primeiro por uma razão egoísta, depois por um brutal sentimento de necessidade de entreajuda, se vai tornar no seu único amigo, sofrendo as consequências que tal situação implica. A lei, segundo a qual quem dá ajuda a imigrantes ilegais pode ser condenado a 5 anos de prisão, nestas regiões, parece aplicar-se mesmo.
É muito interessante, no filme, perceber os diferentes pontos de vista dos residentes no local, que oscilam entre a condenação, a indiferença e a abnegação dos voluntários, que distribuem comida e roupa diariamente aos clandestinos. As nacionalidades destes vão variando conforme se verificam situações extremas nos países de origem mas é quase sempre a guerra o motivo mais forte da procura de outro país para tentar (sobre)viver. E a Inglaterra torna-se apetecível porque, tal como explicou Philippe Lioret, a flexibilização das leis laborais com a desregulamentação do mercado de trabalho, do tempo de Margaret Thatcher, facilitou o trabalho clandestino, o sub emprego e, além disso, a língua inglesa, mesmo que mal falada, continua a ser a que lhes é mais acessível.
O realizador explicou ainda outras coisas: que preferiu um actor com pouca experiência mas que, por isso mesmo, desempenharia bem o papel de um rapaz com 17 anos, idade em que, na sua opinião, se está com um pé na infância e outro na idade adulta; que todos os indivíduos que aparecem no filme são actores e figurantes, não aparecendo qualquer pessoa das que se pretende retratar porque não se pode pagar a ilegais; que o filme, apesar da temática e de ser falado em várias línguas (e do título, acrescento eu) foi subsidiado pelos organismos oficiais franceses; mas Lioret teve que contar todas as palavras francesas e reescrever algumas cenas porque a língua predominante teria que ser o francês.
As nossas opiniões sobre a realidade retratada neste filme podem variar muito. E devemos resistir à condenação pura e simples dos países mais ricos do ocidente que tentam afastar de si estes migrantes. A multiplicidade de questões envolvidas assim o aconselha. Mas, neste filme, são as pessoas que estão em primeiro plano. E não podemos deixar de sentir como nossas aquelas dores.
Refiro ainda uma cena do filme que é das mais impressionantes que já vi no cinema: o momento em que a lancha da guarda costeira inglesa tenta “pescar” Bilal. É que é isso mesmo que faz lembrar: a caça da baleia, por exemplo, sendo o arpão substituído por uma bóia que, para o protagonista, é não de salvação mas de condenação. A resistência ao que parece inevitável é levada ao extremo e também nós, espectadores, nos debatemos pelas nossas vidas.
Obrigada Maria pelo convite para a ante estreia.
A antestreia aconteceu num dia em que, em Calais, se verificaram confrontos graves entre as autoridades francesas e os migrantes (i ou e) consoante o ponto de vista. O tema do filme é exactamente a migração à escala do planeta, levando tantas pessoas a arriscarem a vida para não morrerem. No caso concreto a história passa-se em Calais. Aqui mais perto de nós (a ver em A Caminho da Europa) a Espanha assiste a situações semelhantes.
Acompanhamos a história de Bilal, de 17 anos, que vem do Iraque e que quer chegar a Inglaterra onde se encontra a rapariga de quem gosta (em Londres) e o seu clube de futebol de eleição, onde espera vir a jogar (o Manchester United). Em Calais depara-se com a realidade dura de muitos clandestinos que procuram atravessar o Canal da Mancha, pelos vários meios possíveis. Das várias hipóteses opta por atravessar a nado e é por isso que procura aperfeiçoar-se numa piscina onde conhece o seu instrutor que, primeiro por uma razão egoísta, depois por um brutal sentimento de necessidade de entreajuda, se vai tornar no seu único amigo, sofrendo as consequências que tal situação implica. A lei, segundo a qual quem dá ajuda a imigrantes ilegais pode ser condenado a 5 anos de prisão, nestas regiões, parece aplicar-se mesmo.
É muito interessante, no filme, perceber os diferentes pontos de vista dos residentes no local, que oscilam entre a condenação, a indiferença e a abnegação dos voluntários, que distribuem comida e roupa diariamente aos clandestinos. As nacionalidades destes vão variando conforme se verificam situações extremas nos países de origem mas é quase sempre a guerra o motivo mais forte da procura de outro país para tentar (sobre)viver. E a Inglaterra torna-se apetecível porque, tal como explicou Philippe Lioret, a flexibilização das leis laborais com a desregulamentação do mercado de trabalho, do tempo de Margaret Thatcher, facilitou o trabalho clandestino, o sub emprego e, além disso, a língua inglesa, mesmo que mal falada, continua a ser a que lhes é mais acessível.
O realizador explicou ainda outras coisas: que preferiu um actor com pouca experiência mas que, por isso mesmo, desempenharia bem o papel de um rapaz com 17 anos, idade em que, na sua opinião, se está com um pé na infância e outro na idade adulta; que todos os indivíduos que aparecem no filme são actores e figurantes, não aparecendo qualquer pessoa das que se pretende retratar porque não se pode pagar a ilegais; que o filme, apesar da temática e de ser falado em várias línguas (e do título, acrescento eu) foi subsidiado pelos organismos oficiais franceses; mas Lioret teve que contar todas as palavras francesas e reescrever algumas cenas porque a língua predominante teria que ser o francês.
As nossas opiniões sobre a realidade retratada neste filme podem variar muito. E devemos resistir à condenação pura e simples dos países mais ricos do ocidente que tentam afastar de si estes migrantes. A multiplicidade de questões envolvidas assim o aconselha. Mas, neste filme, são as pessoas que estão em primeiro plano. E não podemos deixar de sentir como nossas aquelas dores.
Refiro ainda uma cena do filme que é das mais impressionantes que já vi no cinema: o momento em que a lancha da guarda costeira inglesa tenta “pescar” Bilal. É que é isso mesmo que faz lembrar: a caça da baleia, por exemplo, sendo o arpão substituído por uma bóia que, para o protagonista, é não de salvação mas de condenação. A resistência ao que parece inevitável é levada ao extremo e também nós, espectadores, nos debatemos pelas nossas vidas.
Obrigada Maria pelo convite para a ante estreia.
Quero ver esse filme!
ResponderEliminarQuanto à música dos Stranglers enviei para o seu mail com pormenores.