sábado, 13 de novembro de 2010

À beira de um lago que enfeitiça

Em 1896, quando estreou em São Petersburgo, foi um fiasco. No ano anterior, Tchékhov dizia numa carta a um amigo: "Estou a escrever uma peça. (...) Escrevo-a com bastante agrado, embora pecando horrivelmente contra as regras de cena. É uma comédia com três papéis femininos, seis masculinos, quatro actos, uma paisagem (vista para um lago); muita conversa sobre literatura, pouca acção, cinco arrobas de amor" *. Mas, n'"A Gaivota" o amor não é linear. Ele serpenteia pelas personagens e dificilmente os desencontros são ultrapassados.
Na encenação de Nuno Cardoso, que vi há algumas semanas, não só o texto, mas o próprio cenário, nos transmitem essa ideia de movimento contínuo. As árvores da floresta obrigam a constantes desvios e o lago reflecte, duplica a imagem de todos os que dele se aproximam, lembrando-nos que nem sempre a realidade é clara.
"TRIGÓRIN: Este sítio é muito bom! (Ao ver a gaivota) O que é isto?
NINA: É uma gaivota. Konstantin Gavrílovitch matou-a.
TRIGÓRIN: É uma bonita ave. Na verdade não me apetece ir embora. Veja se convence Irina Nikoláevna a ficar. (Escreve no caderno.)
NINA: O que está a escrever?
TRIGÓRIN: Estou só a tomar uma nota... Surgiu-me um tema... (Escondendo o caderno) Um tema para um pequeno conto: na margem do lago vive desde criança uma jovem, assim como você; gosta do lago como uma gaivota, e é feliz, e livre como uma gaivota. Mas por acaso apareceu um homem, viu-a e por não ter nada que fazer, destruiu-lhe a vida. Como a desta gaivota. (Pausa.)" *


Foto aqui 
* Retirado da brochura do programa

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