quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Uma das razões/textos poéticos porque gosto de Rosa Maria Martelo

Vidros

Não há como colar o vidro das palavras ao vidro das coisas. Ainda que sendo o mesmo vidro, não há como juntar vidro com vidro e ocultar a cicatriz que não continua o mesmo quando do mesmo se separa. E para mais neste caso, sendo um como o outro translúcido, e eu sem saber de qual dos dois estou a falar agora. Vidro do mesmo vidro, em dois pedaços - contíguos, não contínuos: este, que agora uso, como uma lente, e o outro que através dele procuro ver, sem discernir qual dos dois o mais opaco ou qual dos dois mais transparente.

in Rosa Maria Martelo, A porta de Duchamp, Averno, Lisboa, 2009, p. 19

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