sexta-feira, 6 de março de 2015

Pais e filhos

Comecei a escrever este post num tom generalista que abandonei por me parecer que esta minha experiência não tem necessariamente que ser comum a mais ninguém (embora certamente seja).
Não seria difícil imaginar que a fase da adolescência das minhas filhas (e porque elas não são diferentes de todas as outras adolescentes) não iria ser fácil. Não é, realmente. E ultimamente tenho-me dado conta que esta será, provavelmente, aquela fase das nossas vidas em que o desequilíbrio em termos de personalidade entre mim e elas se encontra mais acentuado e em que a forma como olhamos a realidade se encontra no ponto mais alto de afastamento. Se, por um lado, as minhas filhas estão absolutamente cheias de certezas e não há argumentos que as demovam das suas convicções, eu estou naquela fase da vida em que percebo que as poucas certezas que ficaram da minha própria adolescência, afinal, são bem pouco resistentes à passagem dos anos. No meu caso esta situação é agravada pela circunstância de, até naquela altura, as certezas não abundarem para o meu lado. E se admiro a sua capacidade de defenderem, até com teimosia, os seus pontos de vista, sinto-me impotente por não conseguir explicar-lhes o quanto as suas ideias já foram testadas e ultrapassadas, o quão idealistas e impossíveis de concretizar são alguns dos seus objectivos. Depois ponho-me a pensar que é por ser assim, com esta consciência da imperfeição do passado sempre em mente, que me sinto tão velha e, decididamente, não quero que elas se sintam velhas antes de tempo. Se isso acontecer que seja depois das escolhas que fizeram e dos erros que cometeram. E falar-lhes dos meus erros pode ser importante mas não é determinante para que elas evitem os seus próprios. Mesmo entre pais e filhos as diferenças de personalidade e a perspectiva que advém do lugar em que cada um está podem ser demasiado grandes para que a forma de encarar as situações passadas sirva de aprendizagem. Lembro-me, então, da frase atribuída a Kierkegaard: "a vida só pode ser compreendida olhando-se para trás; mas só pode ser vivida olhando-se para a frente". E, face à dificuldade de conciliar no tempo as duas perspectivas, pois não podemos praticar as duas acções ao mesmo tempo, o que contará mais: compreender ou viver a vida?
Para esta pergunta é claro que não há resposta. Elas continuarão muito diferentes de mim. Os nossos tempos, no que à sabedoria diz respeito, nunca se cruzarão. Sabê-lo será, porventura, uma das maiores angústias dos pais. Estes, além do mais, têm a sua própria vida para viver. Mesmo que, olhando para trás, tenham dificuldade em compreendê-la.

6 comentários:

  1. é um problema, Ana...

    a minha filha ainda só tem 10 anos e já é uma sabidona. sei que vêm ai tempos complicados...

    é um desafio que temos de tentar enfrentar sem dramas e sem deixar mazelas, principalmente neles...

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    1. Pois... A verdade é que todas as coisas fazem parte do crescimento mas a gestão quotidiana das situações não deixa de ser muito complexa...

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  2. Ainda bem que voltou, embora com um tema angustiante, que eu compreendo
    porque passei por esta situação uma vez, na adolescência da minha filha. Foi
    muito difícil eu sei!. Agora eu tenho outra fase desta vez mais atenuada por
    se tratar da minha neta que tem 12 anos. Não é fácil quando as personalidades são muito diferentes e os confrontos acontecem. Desejo que
    alguma compreensão de parte a parte consiga surgir.
    Boa semana.

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    1. Obrigada, Maria. Eu também desejo muito que consigamos entrar em sintonia. :) Uma boa semana para si.

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  3. Gostei muito de ler este texto.
    Não tendo filhos, não posso contribuir com a minha experiência, mas queria só dizer que, por um lado, acho bom que os adolescentes, hoje em dia, tenham tantas certezas e as defendam com teimosia. No nosso tempo, como bem dizes, as certezas não abundavam. Éramos inseguros, submissos e muuuuito dependentes. Eles hoje também são dependentes, claro, mas, pelo menos, têm opiniões, o que revela autoconfiança, algo muito importante, durante toda a vida. E a vida se há de encarregar de lhes mostrar que nem tudo é possível e que cometemos muitos erros, mesmo quando estamos 100% convencidos de que estamos certos. A autoconfiança, porém, é essencial para superar desgostos e desilusões.

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    1. Olá, Cristina. Eu também gostei do comentário. Tudo o que dizes faz todo o sentido. Na verdade também estou bastante satisfeita por elas não serem tão inseguras e submissas como eu fui, ou como ainda sou... Mas o excesso de confiança também pode ser prejudicial. Mas também sei que só com os erros se aprende...

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