Ainda o calor aperta e já os estudantes mais velhos correm para as universidades vestidos de preto e branco envergando as pesadas capas ou levando-as apenas no braço. O traje académico, um nicho de mercado aproveitado pelas empresas que os produzem, é usado com desenvoltura por uns, com alguma falta de jeito por outros. É a integração dos caloiros que os move, dizem. Estes, ao fazerem a matrícula, cumprindo uma obrigação que fariam de qualquer maneira, vêem-se "ajudados", por estes colegas mais velhos, quer queiram quer não. Talvez por serem tão visíveis ficamos com a ideia que, por cada caloiro, há dois ou três alunos mais velhos que zelam pela sua "feliz integração". Penso não existir nenhum estudo sobre a postura dos novos alunos perante as praxes. No entanto, certamente, serão muito variadas, incluindo os que as praticam por prazer até aos que se recusam a participar. Muitos, sem qualquer convicção, limitar-se-ão, de forma passiva, a tolerar a situação pensando que os anos que passarão na universidade serão mais difíceis se não o fizerem. Para esses, a campanha lançada pela Secretaria de Estado do Ensino Superior que tem como um dos slogans “Não és obrigado a ser praxado!" poderá servir como um alerta que eventualmente os fará, pelo menos, pensar.
Em todo este panorama, há algumas coisas que me intrigam (obviamente, sem generalização possível): o afinco com que estudam regulamentos de uma maneira que nunca repetirão com as sebentas; o aprumo dos trajes que vestem que dificilmente repetiriam se fossem incorporados na vida militar; a observância de hierarquias rígidas; a agressividade, mesmo que apenas linguística e aparente, de "praxantes" para com "praxados"; o cumprimento de regras que, em quantidade e qualidade, rivalizam com as de uma verdadeira sociedade secreta. Isto quando, com frequência, esquecem e passam por cima das simples regras da boa educação e da convivência com os seus pares e pessoas com quem se cruzam.
Mas o que mais me chama a atenção e que muitas vezes apercebo em conversas ouvidas na rua, é a ânsia dos novéis universitários em serem praxados como se disso dependesse o sucesso da vida académica ou, pelo menos, daquela parte da vida académica que mais suscita entusiasmo: a que acontece fora das aulas. Não sei se as preocupações com os conteúdos das cadeiras que têm que fazer alguma vez rivalizará com as preocupações em cumprir as normas apertadas impostas pelos códigos das praxes. Fico com a sensação de que o objectivo da frequência universitária não é, para muitos, a formação e a preparação para a vida profissional mas sim este percurso de alguns anos em que o que conta é brincar a ser estudante em vez de verdadeiramente o ser.
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