quarta-feira, 15 de setembro de 2010

O Homem Invisível passou

Lembro-me dele na faculdade (ele frequentava o curso de Comunicação Social) quase sempre junto à mesa de matraquilhos. Segui muitas das coisas que fez, muito por culpa do meu gosto pelo humor (dos programas do Herman, do Inimigo Público…). Recebeu, neste dia 13, o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores pelo seu livro “Deixem Passar o Homem Invisível”. Ainda não li o livro, apesar de já o ter comprado, mas não é só por este escritor ser benfiquista e ter a minha idade que destaco este prémio. É que do seu primeiro romance, “E se eu gostasse muito de morrer” gostei muito, muito mesmo.
É desse romance este excerto:
“Temos frutarias na Venezuela e mercearias na África do Sul, ok, há-de haver um restaurante a servir sardinha fresca de Peniche no Alasca, muito bem, mas que é feito da saga das Descobertas?
Quero lá saber.
Conto as minhas descobertas num instante, se prometeres não rir, mas estás tu farto de saber quais são.
Navego como faz a malta toda, na Net. Mas desconheço se é normal falar-se com tanta gente esquisita, difícil de qualificar (e até perigosa) no mundo, como faço no meu quarto. Na janela cruzetina.
Há pessoas na rede que não prestam para nada, são bostas com pernas.
Outras, no entanto, não me importava de as conhecer ao vivo. Com a evolução diária dos motores de busca, encontras tudo tudo mas mesmo tudo o que te interessa, felizmente ou infelizmente.
Desde que saí de casa, de madrugada, que ando a saltar de assunto em assunto, esta coisa lembra-me aquela, a outra uma nova, a nova uma do passado, vai tudo para a misturadora, e se calhar perdi a noção do que interessa. É muito zapping e pouco timing. Já me deu para ir chatear o Bispo e agora o Camões! Triste Camões, no fim da vida de amores errados, no Tejo, no Mondego, sobre os rios que vão por Babilónia, foi zarolho em África, náufrago na China, esfomeado em Lisboa, ele viu escuro o lume das estrelas.
A verdade é que, passado e presente, tudo me perpassa pela retina, como escrevem os palermas que enviam postalinhos ilustrados das viagens, e os que revêem a vida inteira no minuto em que vão morrer.
E o futuro, deixa-o chegar, que já faltou mais.”

in Rui Cardoso Martins, E se eu gostasse muito de morrer, Publicações D. Quixote, Lisboa, 2006, p. 163-164

3 comentários:

  1. O discurso solto não faz muito o meu género, mas vi a entrevista que ele deu na SIC Notícias e fiquei com curiosidade em ler o premiado.

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  2. A mim, este pedaço de escrita não me convenceu, mas mesmo nada. Demasiados anglicismos, discurso solto muito... light... Talvez o livro premiado seja melhor.

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  3. Manuel e Paulo: escolhi este "pedaço de escrita" um pouco ao acaso só pelas referências ao mundo da www. Não podemos pensar no livro apenas com base nele. :) O tema, baseado num facto estatístico - a elevada taxa de suicídio no Alentejo -, leva-nos a seguir um rapaz por esse mesmo Alentejo, mostrando-nos uma outra imagem de um local aparentemente tão calmo. A mim, o livro convenceu-me.

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