Todas as noites, após o jantar que se comia cedo, a mesa era desviada e as cadeiras eram encostadas à parede. Os bancos corridos ocupavam o centro da sala. As cervejas e os refrigerantes, que podiam apetecer, estavam no frigorífico. As pessoas, maioritariamente homens, iam chegando e ocupando os lugares. Não ficavam muito tempo porque no dia seguinte havia sempre que fazer no campo e porque a emissão não era longa. Mas naquelas poucas horas era todo um mundo que lhes entrava pelos olhos adentro. As notícias, as imagens de um país que não conheciam, de outros países que só imaginavam, os programas que mesmo feitos sem grandes recursos eram seguidos do princípio ao fim; enchiam de surpresa todos os presentes. Olhavam para o aparelho com uma atenção e uma reverência que o próprio padre na missa gostaria de ter para si.
Era assim que terminavam, então, quase todos os dias das minhas férias de Verão naquela aldeia do interior da Beira Alta. Nesses anos 70 do século XX os televisores ainda eram ali um luxo que só as famílias com mais posses podiam comprar. Os meus avós, que tinham "um comércio" e que vendiam as tais bebidas, consideraram-no um investimento e, à falta de um café que só anos mais tarde passou a haver na aldeia, abriam a sua casa para que, quem quisesse, pudesse assistir às imagens a preto e branco que a RTP transmitia.
Muitas conversas, muitas gargalhadas, muitos "oh's" de espanto ali aconteceram. E mesmo quando, numa noite, a programação não era do agrado de todos era certo e sabido que, na noite seguinte, a sala em casa da D. Tina estaria cheia.
(lembrado no dia em que a RTP fez 60 anos)
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